segunda-feira, 16 de setembro de 2013

A Campina



 Ela demorou a abrir os olhos, mas, quando abriu,não reconheceu o lugar em que se encontrava. Estava deitada na grama, era capaz de senti-la sob sua pele, e encarava a copa de muitas, com o sol passando pelas folhas fazendo com que seus olhos ardessem. Ela ouvia também o som de alguns pássaros, mas estes pareciam tão distantes que mais pareciam ser mais a sombra de um eco, como um som ambiente; até onde sua vista alcançava, não via pássaro algum. Não via movimentos em nenhuma direção; nem o vento parecia soprar ali.
 O lugar parecia-lhe estranhamente familiar, como se o tivesse visitado alguma vez na infância mas que se havia esquecido de sua existência. Como havia ido parar naquele lugar que lhe era estranho mas, ao mesmo tempo, tão familiar? Essa pergunta sem resposta a empertigava.Tudo o quanto lembrava era de um cegante clarão branco e de um grito - um grito de homem. Mas o resto... nada. A escuridão plena e esmagadora. Até que acordou naquele lugar, naquela pequena campina no meio do nada em que nenhum ser vivo, além dela, parecia habitar. E mais, que vestido era aquele que usava? Não lembrava de ter um vestido de seda branco e comprido daqueles em seu guarda-roupa...
 Tomada por uma angústia repentina, levantou-se do chão em que até o momento estivera sentada, somente confusa, e começou a andar nervosamente em círculos. Havia se dado conta de outras coisas de que também não se lembrava, coisas mais importantes do que as peças do seu guarda-roupa. Qual era seu nome? De onde viera e como fora parar ali? Tinha família? De quem era o grito de qual se lembrava tão nitidamente? O que fora aquele estranho clarão? Quantos anos tinha? Alisou, exasperada, seu cabelo acaju que já era, de qualquer maneira, liso. Ela não conseguia, não conseguia lembrar!
 Parou de andar em círculos depois do que lhe pareceram horas, e se jogou na relva macia, com um suspiro frustrado. A luz não parecia ter mudado desde a hora em que abriu os olhos e constatou que estava num lugar desconhecido, mas ela tinha a nítida sensação de que havia se passado bastante tempo... Talvez fosse só impressão mesmo, quem sabe. Ficou novamente encarando os raios de sol passando por entre as copas das árvores, sem pensar em nada. Não que essa fosse sua intenção. Sua mente simplesmente se perdeu enquanto analisava os raios solares. Uma parte dela sabia, talvez instintivamente, que quando você para de pensar tanto em algo, quando para de tentar lembrar desesperadamente, a lembrança lhe vem naturalmente, quando menos se espera.
 E foi o que lhe aconteceu.
 Num segundo, contemplava os raios de sol; no outro estava dentro de um carro. A estrada - pelo menos era o que parecia - estava escura, e parecia passar como um borrão diante de seus olhos; o carro estava em alta velocidade. Dentro do carro, ao seu lado, no banco do motorista, havia um homem lindo, que parecia possivelmente bêbado - seu namorado, lembrou, com uma ponta de vaidade. O refrão de "Smells like teen spirit" tocava às alturas. E então, de repente, grandes faróis surgiram quase que imediatamente à sua frente, e uma buzina alta, que sobrepujou o a voz de Curt Cobain, soou ensurdecedora. Um caminhão de carga, surgido sabe Deus de onde. Ouviu o grito do rapaz, mais claramente, chamando um nome, provavelmente o dela própria: Luce. E depois, um barulho ensurdecedor e o nada. O nada escuro e impenetrável.
 Entendeu então, com um comichão esquisito na boca do estômago, como havia parado ali, embora, então, não soubesse, exatamente, onde era "ali". Tudo o que descobrira naquela breve lembrança foi que havia sofrido um acidente de carro. E que estava morta.

2 comentários:

  1. Que... perfect!!! Adorei a atmosfera que me evolveu enquanto eu lia. Foi meio estranho. Senti verde, azul e branco no início e preto e roxo no último parágrafo. Não sei se me entendeu. Dei uma pirada! Coisa de artista. XP
    Kisu ^3^ no seu kokoro <3!

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  2. hahahahhahahahah Maria, vc bugou hahahahahahahha XD <3 mas obrigada *0*

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